Tanta água já puxou meu braço
Tantas vezes já me esqueci
Tantas vezes já senti cansaço
Tantas vezes relutei em vir
Cada dia este caminho faço
Cada dia é preciso mais
Quanto mais maior é o meu descaso
Pois a água não me satisfaz
Quero deixar a corda, o balde, o laço
Quero beber e não precisar mais
Dá-me tua água que a vida que eu traço
Será nova sentirá a paz.”
                                                                                                                                                                                                                 A Moça do Poço –  Sérgio Pimenta


            No Evangelho de João capítulo 4 lemos o relato de um encontro surpreendente; Jesus se encontra e conversa com uma mulher, que naquela época era tratada como um ser inferior ao homem. Até aí, apesar de não usual, não chega a  ser surpreendente pois vemos que Jesus contou com várias mulheres em seu ministério, como Maria, sua mãe, Maria Madalena, a quem Ele perdoou, as irmãs Marta e Maria, entre tantas e tantas outras e sempre as tratou com respeito e dignidade.
            Mas aquela mulher era samaritana. Os samaritanos eram judeus que haviam se misturado com outros povos, e por isso eram considerados impuros pelos judeus. Portanto, este relato de João 4 é surpreendente porque Jesus passa pela Samaria, e puxa conversa com esta mulher, querendo Se revelar a ela. E o mais interessante notar é que é esta mulher apesar de sua vida promíscua, tem uma sede por Deus e uma vontade de adorá-Lo corretamente. É para esta mulher que Jesus profere as suas mais profundas palavras ao falar do novo tempo de uma vida de adoração que Ele veio inaugurar.
            Foi para ela que Ele revelou que logo a adoração ao Deus verdadeiro não seria feita mais em templos construídos por mãos humanas, mas aconteceria dentro de cada nascido de novo, que se tornaria templo e altar da presença de Deus. É para ela que Ele revela que o que importa são adoradores que adoram em espírito e em verdade.
            Este diálogo chega a ser um pouco engraçado, pois Jesus está falando de algo espiritual, usando a figura do poço, da água, mas aquela mulher entende o que Ele diz de forma literal. Ele fala que tem a água da vida para dar, e ela o questiona como Ele pode dizer isso se nem balde ele tem para tirar água. Gosto dessa “ingenuidade” (ou ignorância) que encontramos como resposta quando Jesus revela segredos espirituais profundos. Essa mesma ingenuidade é encontrada em Nicodemos quando Jesus fala sobre “nascer de novo”. (“Voltarei para o ventre de minha mãe?”)
            Essas perguntas feitas a Jesus quando Ele revela algo estritamente espiritual refletem a nossa incapacidade humana de desvendar os mistérios de Deus. Por isso que o apóstolo Paulo diz que as coisas do Espírito são loucura para a carne. (1 Co. 2:14) Precisamos que o Espírito de revelação venha sobre nós e abra os nossos olhos para que enxerguemos os mistérios profundos de Deus. Sem o Espírito, só vamos falar asneiras sem sentido para o Senhor.
            Jesus queria dar a água da vida para aquela mulher, mas ela na sua ingenuidade e ignorância espiritual achava que precisaria do seu balde para retirar o líquido precioso do poço. Mas ela não sabia que a água da vida não é coletada com baldes ou com nenhuma outra ferramenta humana. A água da vida brota dentro daquele que crer. É Deus que abre o manancial e faz começar a jorrar.
            Não existe esforço, conhecimento, habilidade, ou mérito humanos que sejam capazes de tirar a água viva de um poço. O balde representa nossa capacidade de agir, nossa capacidade de procurar uma solução. “Tudo bem. Digamos que eu acredite nessa água da vida, mas com certeza eu tenho que fazer algo para conseguí-la, pra merecê-la.” Nossa incredulidade e nossa natureza não nos deixam crer que se crermos em Jesus ela simplesmente brotará dentro de nós. “Ele quer dar a água da vida? Tudo bem. Maravilha. Deixa eu apenas oferecer o meu balde pra ajudar, pelo menos.”
            Isso nos incomoda. Parece fácil demais. “Quando a esmola é muita, o santo desconfia”, prega o ditado popular. Eu TENHO que fazer algo. Eu TENHO que fazer a minha parte, eu TENHO que buscar o meu mérito. Então, se Deus me salvou, eu vou PROVAR pra Ele que eu mereci ser salvo. E aqui me lembro de uma frase do Rev. Caio Fábio que disse que pregamos a salvação pela graça, mas a justificação pela lei.
            Mas em meio a nossa ignorância, não percebemos quão ridículo é oferecermos nossos baldes à Fonte de Água Viva, o Messias. Ele não precisa dos nossos baldes, nunca precisou. Quais são os baldes? Pode ser confiar no meu conhecimento, nas minhas habilidades, como já disse, mas pode ser confiar na minha capacidade de ser “santo”. A minha pretensa “santidade” pode ser um balde que me impeça de receber a plenitude da água da vida.
            Me entenda bem, a santificação é dever do cristão, mas assim como a salvação, ela deve ser feita na força do Senhor e não baseada no meu mérito ! A salvação e o enchimento com o Espírito e também a santificação não dependem de nenhum fator que possamos providenciar! É graça e obra d´Ele! Nossa parte é simplesmente crer e obedecer!
            Nesses últimos tempos, de maneira difícil tenho aprendido essa verdade. Em muitos momentos sou tentado a oferecer o meu balde, a minha contribuição, mas Ele logo me lembra que eu em mim mesmo nada posso, e que sou totalmente dependente d´Ele. E o desafio é aprender a deixar o balde de lado e mergulhar nos rios de água viva.
            É isso mesmo! Quem quer permanecer com o balde, vai tirar a água pouco a pouco. Quem entender a graça de Deus, joga o balde fora, e mergulha nos rios de água da vida! É o que fez aquela mulher e é o que Ele quer que você e eu façamos também.
“Jesus respondeu: “Quem beber desta água terá sede outra vez, mas quem beber da água que eu lhe der nunca mais terá sede. Pelo contrário, a água que eu lhe der se tornará nele uma fonte de água a jorrar para a vida eterna”.
(João 4:13-14)